Para reverter crise social, Brasil precisa de investimento público e de emprego

O desmonte do Estado, a privatização das estatais, os ataques aos educadores e aos estudantes e à classe trabalhadora, com reformas como a da Previdência, que precariza a arrecadação e, consequentemente retira recursos do Sistema Único de Saúde (SUS), vão provocar uma crise social sem precedentes no Brasil. E para reverter o caos social só há uma saída: priorizar investimentos públicos e gerar emprego imediatamente.

A análise é do presidente da CUT, Sérgio Nobre, e foi feita durante entrevista para o PortalCUT onde fez um balanço do que ocorreu em 2019 e apontou as principais lutas de 2020. De acordo com ele, o país poderá passar por momentos de protestos como os que vêm ocorrendo no Chile, onde a população está há meses nas ruas contra a política neoliberal de arrocho salarial e previdenciário do presidente Sebastián Piñera.

Para o dirigente, uma das lutas mais importantes dos trabalhadores e trabalhadoras e do povo brasileiro é a luta contra a retirada de direitos, a fome e o desemprego. Para isso, diz, é preciso haver investimento público, como fizeram os governos do PT, que utilizaram os bancos públicos e as estatais, como a Petrobras, para investir em grandes obras e gerar emprego e renda.

Sérgio alerta ainda para o desmonte de empresas públicas de pesquisa como a Embrapa e a Fiocruz. Para ele, não se desenvolve um país sem uma base industrial forte e pesquisa.

Leia a entrevista na íntegra:

PortalCUT: Os ataques aos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras nos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, pós-golpe de 2016, foram muitos, mas também teve muita luta, derrotas e vitórias. Que balanço você faz deste período?

Sérgio Nobre: Quando nós sofremos um golpe em 2016 nós dissemos que o golpe não era contra o PT e nem contra presidenta Dilma, e sim contra o povo brasileiro e contra a classe trabalhadora, em especial, e que provocaria uma onda de retirada de direitos, que haveria um processo de entrega da soberania nacional, porque tanto os governos Temer quanto Bolsonaro têm a mesma estratégia. Eles querem que o país volte a ser um quintal dos Estados Unidos, subordinado com política externa e econômica. É disso que se trata e isso vem se confirmando ao longo do tempo.

O maior embate deste ano foi a luta contra a reforma da Previdência que eles comemoraram como vitória, mas foi uma vitória nossa, na verdade. Porque o que eles queriam era acabar com a Previdência pública como a gente conhece, com solidariedade. Eles queriam privatizar, como fizeram no Chile, que é a fonte de inspiração do Paulo Guedes [ministro da Economia], e não conseguiram por causa da luta popular que nós fizemos, com o enfrentamento  no Congresso Nacional, as greves gerais, com destaque aos professores, que pararam o Brasil inteiro com apoio das demais categorias. E por causa da  pressão e do diálogo que a gente fez com a comunidade.

Mas, o plano de destruição está em curso. O governo Bolsonaro quer acabar com o que resta da legislação trabalhista e vender as estatais, entre outras medidas. Ainda tem toda uma batalha pela frente, mas este ano foi um ano em que a gente impediu o avanço da marcha de retirada de direitos que eles pretendiam.

O maior embate deste ano foi a luta contra a reforma da Previdência que eles comemoraram como vitória, mas foi uma vitória nossa. Eles queriam acabar com a Previdência pública e não conseguiram por causa da luta popular que nós fizemos.

PortalCUT: Depois de anos de estagnação da economia sem que os governos pós 2016, apresentassem qualquer proposta de desenvolvimento com geração de emprego e renda, a CUT e demais centrais construíram propostas para o país sair da crise. Quais são as suas expectativas sobre essas propostas?

Sérgio Nobre: Na verdade, os governos de direita, os liberais, partem do pressuposto de que para gerar emprego você tem que precarizar as condições de trabalho. E para isso é preciso acabar com a carteira assinada, com o FGTS [Fundo de Garantia por Tempo de Serviço] e o 13º salário. Isso é uma falácia. O que gera emprego são investimentos.

Se você pegar a história econômica do Brasil, nunca foram feitos investimentos pela iniciativa privada ou pelas multinacionais e sim pelo Estado brasileiro. Em todo momento da história em que o Brasil cresceu foi impulsionado pelo Estado brasileiro e eles estão desmontando o Estado.

É uma falácia dizer que para gerar emprego você tem que precarizar as condições de trabalho, acabar com a carteira assinada, com o FGTS e o 13º salário. O que gera emprego são investimentos.

O desmonte do Estado e as medidas para restringir os benefícios previdenciários têm repercussão muito grave na maioria dos municípios brasileiros porque a maior renda que gira a economia nessas cidades é a renda dos aposentados que vem da Previdência. A gente costuma dizer que o grande banco social do Brasil não é o BNDES e sim a Previdência, que garante o consumo das famílias e, em grande medida as estatais, que são as empresas que impulsionam o desenvolvimento.

No governo do presidente Lula a decisão da Petrobras de fazer plataformas aqui e não no exterior retomou o setor naval que estava morto. Os programas de renda que foram feitos através da Caixa Econômica e do Banco do Brasil, porque Itaú e Bradesco não têm interesse em executar as políticas sociais nem em fazer empréstimo consignado para fazer o trabalhador comprar com juros mais barato, que permitiram que o país crescesse.

Os liberais vão na contramão, eles querem destruir o Estado, entregar as estatais, querem vender o Banco do Brasil  e, isso é uma grande tragédia. E os resultados já estão sendo vistos, se você olhar a quantidade de famílias que está dormindo nas ruas é impressionante.

A situação social do país está piorando de maneira muito rápida e a minha avaliação é que se não tiver uma inversão de caminho nós, até a metade do ano que vem, vamos viver coisas como Chile viveu, as pessoas desesperadas na rua porque elas precisam comer.

Nós estamos caminhando largamente para uma crise social jamais vista no Brasil, e pra reverter essa crise precisamos gerar emprego imediato e para isso o setor público é importante. Tem um monte de escola que está precisando de manutenção, é preciso criar equipes para reformar as escolas, as praças e retomar as obras de infraestrutura que estão paralisadas no país inteiro,  que podem gerar empregos imediatos.

Agora a gente sabe que o governo federal não tem sensibilidade nenhuma, mas têm prefeitos e governadores que estão preocupados com isso e que podem implementar políticas. E é por isso que a proposta da CUT e demais centrais não é só para o governo federal, é para os prefeitos e governadores porque tem muita coisa que pode ser feita. A gente espera que haja bom senso de todo mundo para que a gente enfrente essa crise social que Bolsonaro e Guedes estão levando o país.

Fonte: CUT