Percentual de pessoas infectadas com coronavírus nos bairros pobres da cidade de SP é 2,5 vezes maior do que nos ricos, diz estudo

Um estudo realizado pelo Grupo Fleury, Instituto Semeia, IBOPE Inteligência e Todos pela Saúde mostrou que o percentual de pessoas que se infectaram com o coronavírus chega a ser 2,5 vezes maior em bairros pobres da cidade de São Paulo em comparação aos mais ricos.

De acordo com a pesquisa, o percentual de pessoas que tiveram contato com o SARS-CoV-2 nos distritos mais ricos é de 6,5%, enquanto que nos mais pobres a taxa é de 16%. Ao todo, foram recolhidas 1.183 amostras de pessoas com mais de 18 anos em todos os 96 distritos de São Paulo entre os dias 15 e 24 de junho.

“Eu acho que a questão da desigualdade social ela de certa forma é esperada, a gente já tem visto muitas matérias, muitas colocações mostrando que a epidemia está ocorrendo de formas distintas de acordo com a região da cidade ou de acordo com os níveis sócio econômicos, mas eu acho que a pesquisa ao mostrar esses dados ela traz uma coisa muito importante que é a magnitude dessa diferença. Então, eu acho que esse dado é importante e com as novas rodadas a gente vai poder ter uma ideia ainda mais clara, dessa magnitude, dessa progressão diferencial que a epidemia tem ocorrido no nosso município”, disse a professora do departamento da medicina preventiva da Universidade de São Paulo, Beatriz Tess.

Amostras serão analisadas pela equipe técnica do laboratório Fleury. — Foto: Divulgação/ Fleury

Amostras serão analisadas pela equipe técnica do laboratório Fleury. — Foto: Divulgação/ Fleury

Nível de escolaridade

A pesquisa ainda identificou que o contato com o coronavírus é inversamente proporcional ao nível educacional, sendo 4,5 vezes maior nos indivíduos que não completaram o ensino fundamental (22,9%) se comparado aos que concluíram o ensino superior (5,1%).

Ainda, segundo o estudo, o percentual de indivíduos que tiveram contatos com o SARS-CoV-2 na cidade de São Paulo é de 11,4%. De acordo com os pesquisadores, o resultado aponta uma realidade de cerca de três semanas atrás.

“A gente não pode esquecer que a gente está falando de um retrato que, na verdade, diz respeito a duas ou três semanas atrás e eu chamo atenção a isso, porque esses novos inquéritos que nós vamos fazer pensando mensalmente eles vão ser fundamentais para gente conseguir dar andamento e ter um entendimento mais aprofundado do que a gente tem visto”, afirma Beatriz.

Perfil

O levantamento também aponta que a soroprevalência é 2,5 vezes maior em pessoas adultas pretas do que brancas (19,7% contra 7,9%). Habitações com 5 ou mais pessoas apresentam soroprevalência quase duas vezes maior quando comparadas com residências com apenas um ou dois moradores (15,8% contra 8,1%).

“O IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] divide a cidade em distritos censitários e aí a gente faz um sorteio, escolhe uma parte desses distritos censitários, aí dentro de cada distrito censitário a gente faz um sorteio para pegar qual é a casa que a gente vai e depois dentro de cada casa a gente sorteia qual é a pessoa que vai ser convidada a participar. Isso porque a gente quer ter uma mostra que seja totalmente aleatória, totalmente ao acaso e a gente acredita que dessa forma você tem uma representatividade mais próxima da realidade”, disse Granato em entrevista ao G1 em junho.

Projeto piloto

Em maio, especialistas da USP, Grupo Fleury, Instituto Semeia e IBOPE Inteligência realizaram um projeto piloto que testou 520 moradores de seis bairros da capital paulista, considerados com maior número de casos e de mortes por 100 mil habitantes e concluiu que que o número de pessoas infectadas na cidade de São Paulo poderia ser até 12 vezes maior que o divulgado oficialmente. O percentual de pessoas que tinham tido contato com o coronavírus foi de 5,19%.

Testes sorológicos

Os testes utilizados pelos pesquisadores são do tipo sorológico, ou seja, eles detectam a presença de anticorpos do tipo IgM (imunoglobina M) e IgG (Imunoglobina G), que combatem a Covid-19 no organismo. De acordo com especialistas, o exame detecta a presença do IgM no sangue do paciente, no mínimo, a partir do 7º dia do início das manifestações clínicas e do IgG a partir do 10º dia.

De acordo com Granato, no projeto piloto os pesquisadores verificaram que algumas amostras apresentaram resultados inconclusivos, nem positivos, nem negativos para a presença dos anticorpos e, por isso, algumas pessoas tiveram que refazer o exame depois de alguns dias.

“Quando a pessoa cai nessa faixa, a gente liga para pessoa, comunica o resultado, como a gente faz com todo mundo, mas a gente explica para a pessoa o que aconteceu com ela e pede para deixar passar três ou quatro dias para colher outra mostra, é lógico que isso é exceção, 5% dos casos, até menos que isso, mas a gente tem que contar com essa possibilidade e quando você colhe mais de uma amostra três ou quatro dias depois e a pessoa está transitando de negativo para positivo, você consegue pegar essa mudança, então, isso foi um aprendizado que a gente teve”, relata.